domingo, 28 de fevereiro de 2016

Uma breve história sobre meu primeiro porre - e o que aprendi com ele


Sempre critiquei quem bebia demais e acabava dando vexame debruçada na privada, com alguém segurando seu cabelo pra trás, ou simplesmente saindo do banheiro com o cabelo todo vomitado. Sempre critiquei isso e me esforcei imensamente para manter esse tipo de "acontecimento" bem longe da minha vida. 
Mas aos 21, lá estava eu, debruçada na privada, cabelo preso num coque (que tinha feito antes de esvaziar quase uma garrafa inteira de vinho), no escuro do meu banheiro que tinha um interruptor nada funcional, com minhas duas amigas olhando da porta e rindo do desastre que era eu naquele momento. Mostrei o dedo do meio pra elas, mas a verdade é que eu também queria rir. Acho que nunca estive tão patética na vida, e pra falar a verdade, aquilo nem era tão ruim, pois eu estava em casa. Poderia ter sido pior. 
Eu não me lembro porque comecei a encher meu copo repetidamente. Acho que o gosto do vinho estava bom demais pra ser verdade, eu me sentia leve, leve, leve, cada vez mais leve... Meus amigos ali fumando, o guacamole na nossa frente, tinha alguém dançando, uma música estranha tocava sem parar e me lembro de achar aquilo tudo engraçado de uma maneira que eu não deveria achar. Bebi até não restar mais nada pra beber. E aí me deu sono. E aí eu quis dormir porque lembrei que tinha uma entrevista de emprego no dia seguinte. Mas não conseguiria ir pra cama, pois a seguir viria a cena que narrei acima. Multiplica por dois. 
Quando finalmente consegui dormir, parecia que havia passado apenas um minuto, e lá começa o despertador a me perturbar, às 7:30 AM. Tantos dias pra ter meu primeiro porre, fui escolher logo na véspera de uma entrevista de emprego! 
Estranhamente não me sentia tão mal, me sentia apenas cansada, mas nada como aquelas pessoas dos filmes que acordam morrendo depois do porre do dia anterior, talvez porque minha amiga me obrigou a tomar água antes de dormir.
Tomei um banho, tomei café da manhã, passei uma maquiagem leve, e lá fui eu, com a minha blusa de entrevista, encarar o sol de verão do Inverno do Rio. Tava calor e de vez em quando eu sentia um leve enjoo. Passei a manhã inteira fazendo o processo seletivo, bem demais pra falar a verdade. Não fiquei nervosa e nem ansiosa como costumo ficar, fiz uma boa entrevista, apesar do meu teste de conhecimentos não ter sido tão bom assim, afinal, já era formada no Ensino Médio há quase 5 anos. Pelo menos me salvei na redação. 
Acho que não fiquei nervosa porque ainda não tinha assimilado tudo o que havia acontecido no dia anterior. Eu estava numa pequena crise existencial pelo que havia acontecido, ia contra alguns dos meus grandes princípios. 
Mas a verdade é que eu já estava precisando de um porre há muito tempo. Às vezes você só precisa ficar fora de si pra enxergar as coisas numa outra perspectiva, mesmo que essa perspectiva seja seu vômito no vaso. Naquele dia eu vi que tudo sempre muda e todos são capazes de quase tudo. Quem é uma rocha imutável? Eu não sou, e na verdade realmente precisava disso pra relaxar e aceitar que não posso fazer tudo certo o tempo todo e que tudo bem por isso. 
Todos nós precisamos fazer coisas estúpidas de vez em quando, todos nós precisamos de um intervalo nas cobranças pessoais e busca excessiva pela perfeição... Não que eu tente ser perfeita, mas é verdade que às vezes me estresso pela importância desnecessária que dou à certas coisas. 
Aquele porre foi minha expiração, porque até então eu só inspirava.






sábado, 20 de fevereiro de 2016

Ebulição

Ebulição 
Às vezes não tem perdão 
O que está dito, está dito 
Não há volta
Não há resposta 
Há motivos 
Que não justificam 
Um momento de ebulição.
Pois apenas um momento 
Muda uma vida inteira.
Onde sua ebulição está levando você?

Ebulição
Gritos
Tantas coisas quebradas 
Não há cola que junte de volta 
Não há fita adesiva que remende 
Não há pedidos de desculpas suficientes 
Pra apagar todas aquelas bolhas que saíram de uma boca 
No ponto de ebulição.

Como é possível passar do estado líquido
Ao estado de soco?
Socos mil
Nas lembranças felizes 
E na confiança lentamente construída 
A primeira bolha 
Destruiu tudo 
As outras 
Viraram apenas vapor.

Ebulição 
Há som
Cor 
Forma
Porta batida 
Na cara
Porta que nunca mais abre 
Maçaneta quebrada 
Mente revirada 
Coração em pedaços 
Meu Deus, apenas 22 
Mas já com tanta bagagem acumulada 
De uma vida feita 
De ebulições. 


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Vá ao cinema sozinho



Vá ao cinema sozinho.
Vá também com sua melhor amiga ou com o seu namorado, ou seu melhor amigo e a sua namorada, ou vá com os dois, mas de vez em quando, faça o favor de ir sozinho.
Vá ao cinema sozinho apenas pra observar a entrada das pessoas na sala. Vá sozinho para prestar total e completa atenção no filme, deixe-se absorver.
Ir ao cinema sozinho é algo sobre você, mas principalmente sobre os outros. Ir ao cinema sozinho tem a ver com olhar pra fora, tem a ver com observar outras coisas que você não seria capaz de enxergar se estivesse acompanhado. Tem a ver com liberdade, tem a ver com proporcionar-se, sem pena, de fazer algo apenas porque quer e não porque foi padronizado assim.
Tem a ver com desligar-se um pouco do próprio mundo, que às vezes está num dia muito caótico e perceber outros, observar, pensar, entender, que não existe apenas o seu mundo, o seu espaço, entender que não existe apenas você.
Se o seu mal (como é o da maioria dos seres humanos) é só falar e nunca ser capaz de escutar, pratique o ato de ir ao cinema sozinho. Você vai perceber com o tempo, que, existem outras vozes, outros dramas, outras alegrias, outras maneiras de viver, e isso te expandirá em questão de senso de coletividade, e acima de tudo, te ajudará a conhecer mais sobre si mesmo.
Conversas paralelas, expressões faciais, gestos, risadas estranhas, risadas silenciosas, abraços, beijos, carinhos, brigas, silêncio. Tudo isso acontecendo ao seu redor, tudo isso acontecendo fora do seu mundo.
Se você é capaz de olhar pra tudo isso sem sentir-se solitário por estar no cinema sozinho, você aprendeu, acima de tudo, a conviver com a única companhia que nunca te larga: Você.
Ir ao cinema sozinho vai te ensinar a diferença entre estar sozinho e estar solitário, pois é possível sentir-se acompanhado entre várias pessoas desconhecidas e é possível também sentir-se solitário durante uma conversa com alguém que está na sua frente.
É importante saber distinguir.
Então, por favor, de vez em quando, vá ao cinema sozinho.

Escrito no dia 3 de fevereiro de 2016.

Tenho tentado




Estou tentando me tornar uma pessoa melhor.
Mas os preços no mercado estão absurdos.
E eu tenho trabalhado pra poder bancar minha vida e meus estudos. E tenho estudado pra conseguir um trabalho melhor.
Tenho vivido assim... Fazendo muita coisa e fazendo nada. Tenho vivido com o sentimento de que estou perdendo muita coisa. Não tenho vivido o que gostaria de estar vivendo.
Mesmo assim, estou tentando me tornar uma pessoa melhor.
Mas como posso me tornar uma pessoa melhor com esses preços absurdos no mercado, com a conta de luz mais alta do que o teto do meu humilde apartamento alugado, vivendo sempre no limite do meu saldo, com medo de ficar doente e não ter dinheiro pra comprar remédio?
Como posso me tornar uma pessoa melhor dessa forma?
Tenho quase 22 anos e costas cheias de peso. Tenho quase 22 anos e um milhão de sonhos. Tenho quase 22 anos e muita responsabilidade. Tenho quase 22 anos e mal consigo viver como uma garota de 22 anos.
Não foi assim que eu planejei, não foi dessa forma que idealizei me tornar uma pessoa melhor.
Mesmo assim, tenho tentado. Tenho tentado não ter medo de andar sozinha na rua à noite, na minha volta do trabalho. Tenho tentado não ter medo de ser estuprada, tenho tentado não ter medo de ser assaltada, porque a sociedade em que eu vivo tem passado e presente, cheio de desigualdade social, onde chamam mendigo de vagabundo e dizem que ele não está contribuindo. Só queria entender o que se passa na cabeça de pessoas que dizem isso, será que realmente pensam que quem mora na rua, mora porque gosta? E será que realmente pensam que um mendigo vai ter dinheiro pra imprimir um curriculum vitae e entregar numa empresa? E será que realmente pensam que alguém vai contratar um mendigo pra trabalhar? Ninguém pensa que ele precisa de ajuda, que antes precisa de meios pra se reerguer, meios que ele não tem? Todos querem uma chance, mas ninguém nunca quer dar uma chance.
Às vezes tenho vergonha de ter um sapato no pé enquanto outra pessoa na minha frente não tem nem água pra beber.
Tenho vergonha de reclamar da minha vida quando existem tantas pessoas piores ao meu redor, pessoas essas que eu não tenho condições de ajudar. Ainda. Porque eu quero, e muito.
Tenho muita vergonha de viver nesse país desigual, e às vezes, tenho muita vergonha de ser branca num país com passado escravocrata. Passado mesmo?
Tenho tentado ser uma pessoa melhor, mas o meio em que vivo não me dá muita esperança.
Tem gente muito pior do que eu, mas isso não diminui minhas dores.
Cada um sabe o paraíso e o inferno que é viver a vida que vive.
E eu tenho momentos muito bons. Na verdade, as coisas poderiam ser muito mais complicadas do que são, pois tenho a sorte de dizer que tenho pessoas com quem realmente posso contar na vida.
Mas a verdade é que em muitas vezes eu assumo a personalidade de uma pessoa ruim, e não da pessoa melhor que eu tanto almejo ser.
Tenho tentado ser uma pessoa melhor mas tem ficado cada vez mais difícil conseguir.
Se eu não conseguir me tornar uma pessoa melhor, antes que eu desista, serei pelo menos um pouco mais forte.
E tenho certeza que existem jovens no país inteiro passando pelos mesmos desesperos que eu. Ou não.
Bem, só quero que os preços do mercado voltem a ser normais de novo, só isso.
Pois tenho tentado, mas não sei por quanto tempo ainda vou conseguir me agarrar à minha filosofia do "Faço minha parte mesmo que os outros não façam a deles." 
Tenho tentado.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Não significa nada em especial, apenas que eu penso sobre

É água que bate na pedra quente 
Faz subir aquele cheiro de chuva 
Que faz com que todos pensem numa possível mudança 
Mas então... Passa.
Existe apenas por um momento 
E depois é como se nada houvesse acontecido.

É vento na cozinha
Apagando o fogo do fogão 
Entra pela janela da área 
Traz poeira.
É uma estação indefinida 
É confusão de um coração 
As reviravoltas da vida 
Que eu já não aguento mais.

E é isso, e é aquilo 
E sou eu, e é ele 
Mas nunca somos nós 
E assim, vou correndo sozinha como sempre fiz 
Nunca tive paciência pra andar por alguém 
E assim, vou vivendo por um triz. 

Minha criança de 8 anos estaria orgulhosa de quem sou agora 
Mas a minha de quase 22, não quer nem olhar na minha cara.
Nada  nunca é o bastante.
O tempo está passando e algumas coisas inesperadas têm acontecido 
Mas mesmo assim, sei que cumpri as promessas que havia feito, há tanto tempo, 
Pra minha criança de 8 anos. 
E essa é a única coisa que me tranquiliza. 

O que perturba sinceramente 
É a minha certeza, cada vez mais total 
De que nunca serei capaz de agradar minha criança atual 
E isso me aterroriza 
Me petrifica 
E me transforma, cada vez mais 
Em alguém bem diferente do que eu sonhava ser.

É a vida. 
E a certeza de que sempre sei menos que achava que pensava.
E nesse momento, só o que eu queria 
Era um abraço da minha criança de 8 anos 
Pois a minha de 22 está ocupada demais fazendo planos inalcançáveis 
E tem olhos cegos pro presente.

Eu ainda estou aqui... 
Embora não saiba 
Por quanto tempo.