É antropológico:
mulher odeia ser mandada. São séculos e séculos de opressão. Não dê corda, que
já cheira a forca. Vale, inclusive, para a masoquista. Gosta de firmeza, não
que alguém diga o que ela deve ou não fazer. Não seja autoritário. O feminismo
não é conversa de sapatão.
Que aconselhe, não
emplaque uma ordem. Que ofereça um palpite, este é despretensioso como um
assobio, é soprar uma melodia e permitir espaço para que ela complete a letra.
Finja que está no chuveiro – menor o risco de se afogar. Fale cantado. Quem
canta nunca será um ditador.
Posso estar
plenamente equivocado, sou tão bonito quanto carro de eletricista, mas mulher
aprecia é sentir saudade. Quando o homem desaparece e ela corre para
procurá-lo. São coisas do cotidiano. Fui percebendo que a conversa com a minha
namorada estragava sempre do mesmo jeito. Havia um método no erro. Uma
insistência de minha parte. Uma frase morse que truncava o entendimento. Depois
que pronunciava aquilo, nada mais funcionava. Da calmaria, ela migrava para um
estado nervoso e impaciente. A transformação de sua atitude me baqueava: O que
foi? Será que perdi algo? Retrocedia para caçar uma gafe. Cansei até captar o
sinal. O homem ainda tenta melhorar sua imagem com o bombril na antena.
Eu dizia “você tem
que” a cada início de diálogo. Impositivo, não agia por mal, era um hábito,
buscava convencer com “você tem que”. Parecia que tinha a solução dos problemas
do mundo. Persuasão é a sedução para quem não tem paciência. Meu caso; não
cuidava da linguagem e depois estranhava o silêncio dela. “Você tem que” é um
mandado de segurança. É atestar que ela não desfruta de condições de conduzir a
própria vida. Virava um segundo pai, determinando suas atitudes. Fugia da
cumplicidade, vinha com os mandamentos e as condicionais de comportamento para
que merecesse a mesada.
O homem não botou na
cabeça que a fragilidade da mulher não é dependência. Ela não precisa ser
protegida, e sim respeitada. Existe uma diferença aguda no tratamento. Depois
que ela fica braba não adianta remendar. Emerge um pânico das cavernas, o
receio de ser puxada pelos cabelos e pelas palavras. Igual é chamá-la de louca
no meio de uma discussão.
Quem não encheu o
pulmão para desabafar “você está louca!”, com aquele grito catártico, que serve
como elevador para todo o prédio? Eu confesso, mais de uma vez. É novamente
afirmar que ela não tem domínio, que nem sabe o que está falando e menosprezar
sua opinião. Pode até ser louca, mas não chame de louca, senão ela não vai
recuperar o juízo. Na história do pensamento, quantas mulheres foram enviadas
para o hospício devido a sua autonomia? Quantas receberam eletrochoque ou
sofreram lobotomia em função da independência de estilo? Significa um joanete
ancestral, um calo antiquíssimo, não pise.
Joana D’Arc não foi
uma bruxa. Assim como vassoura não é para voar, é para varrer qualquer sujeira
machista dentro de casa.
Fabrício Carpinejar
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